O CORVO


Certa noite, acabrunhado, meditava eu, já cansado,
Sôbre estranhos alfarrabios, suas lendas, seu passado,
   Quando - a cabecear de sono - ouví pancadas desiguais,
Como se, de leve, houvesse alguém batendo a minha porta;
"É visita" - murmurei - "que está a bater a minha porta,
                Isto só, e nada mais."

...

E o ondular, sedoso e langue, das cortinas côr de sangue,
Me excitou, me encheu de horror desconhecido, e pôs-me exangue,
   Tanto que eu, para acalmar meu coração de ânsias letais,
Repetia: - "Uma visita que me vem bater à porta -
É visita retardada que me está a bater a porta;
                Isto, sim, e nada mais."

...

E o maldito não se importa, não se move ou se transporta
Do meu busto, alvo, de Pallas, encimando a minha porta;
   E os seus olhos - aos de um demo que sonhasse - são iguais;
E da luz um feixe intenso lhe projeta a sombra ao chão;
E minha alma, desta sombra que flutua, alí, no chão;
                não se livra nunca mais!



(1ª, 3ª e última estrofes)


trad. Emílio de Adour - 1945






apud John E. Englekirk

in A Literatura Norteamericana no Brasil - Revista Iberoamericana, Vol. XV, Núm. 29, Julho 1949, p. 110 pdf.

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