O CORVO
Ao meio dia, maldita hora Aquela fome que sempre apavora, Eu, com a vista pesada e a mão na barriga Voltando de uma aula muito sofrida Sobre a carótida e a artéria aorta Ia pensando em comer uma torta De chocolate com aquele creme branquinho Que minha avó de vez em quando faz Quando então ouvi chegar a pizza do vizinho Há de ser da Fiori, e nada mais. Ah! Bem me lembro, bem me lembro Estava faminto e sofrendo Cada calabresa que via, uma nova agonia Moreu então toda minha alegria Eu, ansioso por comida, tentava Não pensar naquela caixa que o vizinho pegava Quatro queijos (oh não!) que gula esmagadora Isso vizinho, não se faz Correrei para a casa de meus pais agora E pediremos tanta pizza, que não acabará jamais. Minh´alma alegrou-se, pois tive sorte Minha mãe também sentia fome forte Pensei: “Peçamos para nós, para mim e para senhora Uma pizza logo, sem mais demora Mas como eu tenho estomago de ganso Peça qualquer coisa, que tudo me deixa manso Qualquer sabor que seja, que esteja em sua mente Mas lembre-se, não como vegetais Com exceção da cebola, que como prontamente Somente cebola, e nada mais. Espero co’a alma incendiada Logo depois ouço a chamada Mas não está na porta, o moço da Pizzarella Será que ele deixou uma pizza na janela Alguma pizza com cebola? Pensamos Eia, sem pizza, eia, vejamos Onde está o motoboy misterioso? Não ouvi a chamada, não mais Achei que era de novo só um pivete maldoso Deve ser um muleque apenas, e nada mais Abro a porta, e derrepente Vejo tumultuosamente Entrar um motoboy,sem pizzas nem iguarias Não despendeu em cortesias Um minuto, um instante. Tinha o aspecto De rapaz diferente, quase uma lady. E pronto e reto Falando com ele minhas sujas falas Pergunto da pizza que ele traz Fica parado, em uma das salas Parado fica, e nada mais. Percebi que o veado não respondia Às perguntas que eu lhe fazia Nada falava da pizza que trouxera E também não a entregara Na verdade, fiquei puto com isso Filho da puta, assim, eu nunca tinha visto “Me dê minha pizza – gritei – Seu bosta!” Mas ele, me olhando com uns olhos mortais Disse como quem tem uma firme resposta Sem pizza pra você. Nunca mais. Estremeço, e meu pai ali, parado Em pé, e com cara de abobado Com um sorriso que não some, ferrenho Vira, e me vendo na dor que tenho Me mostra um prato. Normal comida Com feijão, arroz e carne bem moida Salada de alface e sopa de abóbora Ruim que não podia mais Minha mãe dizia, enquanto minh’alma chora: Coma mais, coma mais.
trad. Bernardo Simões Coelho - 2005
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