Um poeta...

Neuza Pinheiro
(para Mariana e Lia, estrelinhas. Para Pedro estrelo Gaia)

Era uma vez...huum...humm...era uma vez um poeta. Vocês sabem o que é um poeta? É alguém que quando acorda olha pro sol e diz: "O sol escreve na minha pele". Depois, quando vai dormir, olha pra noite e diz: "A noite me pinga uma estrela no olho". Então era uma vez um poeta e tanto, um poeta de verdade,desses que olham para um aquário pequenininho com um peixinho minúsculo e pensam: "Do aquário para o mar!"

Incrível alguém ver um mar tão imenso através de um aquário tão pequeno! Mas ele era poeta e poeta é assim - maluquinho, mágico, vê tudo de outro jeito.

Quem não for pelo menos meio mágico ou pelo menos meio maluquinho, olha e diz: "é apenas um sonhador"... Ele era um sonhador, claro. Sonhador... e poeta!

Vou descrevê-lo melhor, assim vocês podem até fazer um desenho legal. Vamos lá!

* Bigodes enormes e compridos, iguais aos de um mexicano (mas não era mexicano... ou era?)

* Olhinhos sempre atentos, parecidos com os de um chinês (mas não era chinês... ou era?)

* Carinha clara a rosada, parecida com a de um polaco (mas não era polaco... ou era?)

* Jeito de andar que gingava pra lá, pra cá, parecido com uma escola de samba inteirinha!

Ah, esse poeta! Dá até pra pensar que ele sozinho era vários poetas!

Na última vez que vi esse poeta, ele usava calças amarelas cor de sol, camiseta parecida com um jardim de tão florida. De repente, com seus óculos imaginários atravessados na ponta do nariz, me disse: "A sombra máxima pode vir da luz mínima". E lá se foi pro país das maravilhas com sua Alice.

Bem, meus queridos, se uma história de poeta tem moral, que seja: não se deve dizer de um poeta era uma vez. Um poeta de verdade é. Para sempre. "Não fosse isso e era menos". Vocês sabem, certamente, que o menos subtrai. E um poeta é sempre mais... e mais!



in Folhinha, Folha de S. Paulo, agosto de 1984.