Uma vez, próximo à meia-noite, eu ponderava, lacerado, sobre meu hábito já ultrapassado. Em cochilo, com a cabeça que o pescoço mal suporta, ouviu o som de alguém gentil batendo e batendo à minha porta. “É uma visitante”, murmurei, “que bate à minha porta. É somente isso e zero mais”.
Solitário a ansiar pelo próximo dia, em vão buscava desapoquentar a angústia que feria. Havia as esmagadoras saudades imortais da mulher, Lenora, que agora já nem nome possuía mais. E que agora, nem ao menos um, verá não.
Mas, de repente, ouviu o fragor triste e misterioso à ingresso de meus portais, a ruir a espírito, enchendo-a de terrores anormais, em sensação nunca antes experimentada. Naquele momento, senti a mão formigar, congelei, a repetir: “É uma visitante atrasada. É somente isto e zero mais”. Enfim senti-me possante, a desculpar-me, abri os portais, sem mais hesitar. Mas a minha frente somente a negrume a divisar e zero mais.
Encarando o escuro profundo, retido ao portal, com temor, sonhando acordado o sonho que nenhum mortal deveria ter sonhado. Mas só silêncio brutal e a quietude. Uma única termo, minha, afora foi pronunciada em um sussurro: “Lenora?” Um repercussão sem vida devolveu a termo: Lenora. Foi somente isso e zero mais.
Voltei à sala com a espírito que se esfacela. De novo escutei, desta vez à janela, batidas colossais, um impropério. “Certamente há um pouco detrás dos vitrais, resolvo o mistério, é só o vento e zero mais”.
Abri portanto a veneziana e, em meio à motim da cortinado, entrou um corvo imponente. A ave, indiferente, pousou sob um busto de Atena com a sentença grandiloquente. Ficou ali parado e zero mais.
Pensei que o Corvo riria da minha triste fantasia. A ave manteve a face rígida e sombria. Diante daquele pássaro vadio, perguntei em tons cordiais, qual o seu nome. E o corvo disse: “Nunca mais”.
Pus-me maravilhado com o corvo dos quais nome era nunca mais. Porém o bípede continuou empoleirado e suas palavras eram sempre iguais. Ao olhar para a ave, lembrei que outros já me haviam deixado. Não haveria dúvidas de que, na manhã seguinte, o corvo partiria conseguinte, tais quais minhas esperanças rumaram fatais. E o corvo disse: “Nunca mais”.
Assustado com a repetição de palavras tão apropriadas, conjecturei que aquele ínfimo estoque, fora aprendido de um triste rabi de ideias arrependidas, a quem sofreu por um impiedoso toque da esperança corroída pelas desventuras sepulcrais. E o corvo disse: “Nunca mais”.
Mas aquilo era fantasia causada por miragem que o corvo trazia. Enterrei-me na poltrona e, na frente ao pássaro insensível, pensei qual significado teria aquela ave horroroso. Mas o que obtinha era os constantes sinais: “Nunca mais”.
Eu a conjecturar senti o olhar ardente do bicho meu peito queimar. A luz trêmula clareava a almofada, que outrora Lenora descansava. Eu achava que ali há de se sentar quem sabe em roupas celestiais. Disse o corvo, “Nunca mais”.
Sob o ar denso, eu alucinei o cheiro do perfume que dela partia. Em meu desatino, haveria um querubim a conflagrar um incenso celestino. “Portanto, existe tratamento para minha melancolia e outros sentimento infernais?” Disse o corvo “Nunca mais”.
“Portanto a mim diz quem a pôs doente? Quem a trouxe as primeiras quedas? Escuta e me atende! Por que esse firmamento e Deus que adoramos permitiram a ela esquecer-se de tudo, de si e alegrias legadas? No éden ela se recorda de nós em pensamentos espectrais.” E o corvo disse: “Nunca mais”.
“Confirme minhas suspeitas em razão tardia de que em ressonâncias e outros exames havia a tratamento escondida. A oportunidade perdida em ignorâncias e vexames a fazer a vida erodida? Erros que arrancaram esperanças reais.” E o corvo disse: “Nunca mais”.
“Retorne para o limbo, corvo, saia de minha moradia sem vestígios. Ou diz se a sossego de anjos veio recompensar a morte crescente em presságios? Ou qual a razão de uma morte antecipar a morte completa? Faça-me saber se ela me sabia, quando dela zero mais se ouvia, se ainda havia paixão de quem nem se lamenta. Tire-me a agonia que já me secção em dor, traga-me a luz de claros castiçais!”. E o corvo disse: “Nunca mais”.
E o corvo está ainda empoleirado sobre o busto de Atenas. Seu olhar diabólico continua pairado. A luz lúgubre continua a traçar ao pavimento suas sombras obscenas. Nestes desenhos funerais, o meu espirito ali inferior se levantará, nunca mais!
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