O CORVO


Eis o velho Corvo
Seu ar sombrio, seus ais
Em nobres haikais

Meia-noite. Eu lia                                                                                                 
Velho livro e leve, ouvia                                                                                                  
Batidas iguais

Ah! Frio dezembro!                                                                                                   
Junto ao fogo, um nome, lembro                                                                                
Lenor - e ardo em ais

E a cortina errante                                                                                                    
Assustou-me. "É visitante                                                                                           
Junto aos meus umbrais."

"Senhor, um momento!                                                                                           
Eu estava sonolento."                                                                                           
E abro os meus portais                                                                              

E vejo, temeroso                                                                                                      
O horizonte silencioso                                                                                           
Treva e nada mais

Ao quarto, voltando                                                                                                    
Chego à janela, a alma queimando                                                                                   
E ouço um toque a mais

Ao abri-la, um susto!                                                                                                 
Voando, um Corvo entrou e no busto                                                                                       
Pousou e nada mais

Já sorrindo, indago:                                                                                       
"Tens nome, ó ser aziago?"                                                                                                
E o Corvo: "Nunca mais."

Surpreso, olho a cena                                                                                             
A ave, no busto de Atena                                                                                        
Disse os nomes tais!                                                                                            
                                                                                                                                                                                       
Enfim, falei: "Na aurora                                                                                    
Vais, como os amigos de outrora."                                                                         
E o Corvo: "Nunca mais."

"Decerto ele diz                                                                                                     
O refrão de um dono infeliz                                                                                     
Carregado em ais"

E esta ave do medo                                                                                                
Guarda, agourenta, um segredo                                                                            
Nas sílabas tais

Calado, cismava                                                                                                   
E o Corvo, o olhar me inflamava                                                                                 
E ela, aqui, não mais...

O ar se encheu de incenso                                                                                                
"Um nepente dos céus", eu penso                                                                          
"Bebe e esquece os teus ais!" 

"Profeta! Ave escura!                                                                                                             
Existe um bálsamo que cura?"                                                                                            
E o Corvo: "Nunca mais."

"Profeta! Ave ousada!                                                                                                   
No Éden, abraçarei a amada?"                                                                                       
E o Corvo: "Nunca mais."

"Tua voz, tu levas!                                                                                                              
Deixe-me só! Volta às trevas! 
Regressa aos temporais!"

E o Corvo, pousado                                                                                                        
Traz, no olhar, o anjo rebelado                                                                                          
E à luz, ele sonha  

E em sua sombra medonha                                                                                       
Não me erguerei - nunca mais! 







Versão em haikais de Paulo Cesar da Costa Pinto - 2015





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